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Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa

Este artigo, “Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa”, chama a atenção para três factos:

De facto, desde há muito tempo, que os agentes económicos têm de cumprir diversos requisitos relativamente ao ruído.

Com a publicação do Regulamento Geral do Ruído pelo Decreto-Lei 9/2007, entrou-se na fase em que nos encontramos atualmente.

Como estes requisitos são muito objetivos, as pessoas com formação técnica, como é o caso dos engenheiros, que são na maioria das vezes os gestores das infraestruturas industriais, são facilmente levados a pensar que, cumpridas as prescrições legais explicitamente relativas ao Ruído,  no Regulamento geral sobre o Ruído, o tema fica encerrado.

Todavia, os Tribunais trataram de chamar a atenção que, de facto, isto não corresponde à realidade, por estar consagrado que o indivíduo tem direito ao Conforto e à Saúde.

Chegou-se assim, a uma situação em que, os Tribunais tornaram claro que o cumprimento do disposto no Regulamento Geral do Ruído ou outra qualquer regulamentação associada ao ruído, é condição necessária mas não suficiente.

De facto, o poder judicial chega mesmo a referir que o RGR constitui apenas uma “ferramenta administrativa para efeitos de licenciamento”.

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa – as contradições

Por isso, este facto levanta novos desafios, devido às orientações do poder judicial, frequentemente, entrarem em contradição com as disposições técnicas da Lei do Ruído, no que se refere à avaliação de incomodidade.

Por outro lado, constata-se que as disposições técnicas da avaliação de incomodidade estão obsoletas e não refletem o que se sabe, hoje em dia, sobre este tema.

Desta situação contraditória, surge a necessidade de dar uma contribuição para a clarificação desta situação e surge assim este artigo “Ruído de baixa frequência- a legislação portuguesa”.

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa – lacunas técnicas 

Para a grande maioria das pessoas, um ruído específico é considerado incomodativo, ou não, em função dos seguintes fatores:

  1. Nível sonoro 
  2. Espectro de frequência (tonalidade e ruído de baixa frequência)
  3. Características temporais
  4. Atividade das pessoas
  5. Altura do dia
  6. Tempo de exposição
  7. Atitudes individuais em relação à fonte de ruído

Nível sonoro

Tem-se que, o nível sonoro, é a principal característica do ruído que determina o desconforto.

Quanto maior for o nível sonoro, maior é a reação negativa e, consequentemente, o incómodo associado.

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa -nivel de ruido ao longo do tempo
Figura – nível de ruído ao longo do tempo

Espectro de frequência

A cada espectro de um ruído, correspondem reações de maior ou menor incomodidade.

  • Um ruído com um timbre neutro (ex: o barulho da chuva) não é incomodativo.
  • O grau de incomodidade, é mais elevado para tons puros, do que para sons musicais ou ruídos aleatórios, da banda larga.
  • Em geral, quanto maior é o conteúdo tonal de um ruído, maior é a incomodidade.
  • Ruídos de o tipo “chiar” de travões ou silvos, são particularmente desagradáveis para o ouvido humano.
    • Ex.: ruído do metropolitano numa curva apertada, provocada pelo deslizamento forçado das rodas metálicas sobre o carril metálico.
  • Num espectro uniforme, existe um aumento de incomodidade causado pela emergência de tons puros.

Para além destes fatores, hoje em dia é conhecido [2] que a reação a ruído de baixa frequência (8 a 125 Hz) é distinta de ruído a frequências mais elevadas.

Isto também deve ser levado em conta, quando se efetua uma avaliação de incomodidade [3].

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa - analise de frequência em terços e um terço de oitava
Figura – análise de frequência em terços e um terço de oitava

Evolução do nível de ruído ao longo do tempo

Os ruídos intermitentes, bem como os resultantes de impactos, explosivos ou tiros, são mais incomodativos do que ruídos estáveis e contínuos – como o barulho da chuva – porque são repentinos e inesperados.

  • Estes tipos de ruídos, podem mesmo provocar uma reação reflexa de susto, de sobressalto, com efeitos não só psicológicos, mas também físicos.
  • Entretanto o corpo só volta ao seu estado prévio, após alguns minutos.
Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa - resposta temporal do ruído
Figura – resposta temporal do ruído

Actividade desenvolvida pelas pessoas

Nem sempre se tem a mesma reação, em relação a um mesmo ruído particular, dependendo esta reação:

  • Do que se esteja a fazer no momento;
  • Da atividade;
  • Da altura do dia em que ocorre o ruído.

Por exemplo, na sala de estar enquanto se está a ler, é natural que se fique  mais incomodado pelo ruído de um corta relva, do que a pessoa que está a trabalhar com o ele, que o considera normal atendendo ao que está a fazer.

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa - atividade barulhenta
Figura – atividade barulhenta

A seguir encontra-se uma lista de atividades, apresentadas de acordo com o seu grau crescente de sensibilidade, em relação a um ruído incomodativo:

  •           Atividade manual
  •           Atividades sociais
  •           Atividades caseiras
  •           Atividade intelectual
  •           Sono

A altura do dia

Um dia normal, para a maioria das pessoas e para a legislação, pode-se dividir em três períodos:

  • Período de trabalho,
  • Período de laser;
  • Período de descanso.

Critérios diferentes, serão então usados, para os diferentes períodos do dia:

  • Madrugada,
  • Manhã,
  • Tarde,
  • Princípio da noite 
  • Noite.

Desta forma, para simplificar, normalmente considera-se o dia dividido em três períodos:

  • Diurno
  • Entardecer
  • Noturno.

barulho noturno

Duração da exposição ao ruído

Para a determinação do grau de incomodidade, a duração da exposição ao ruído, é um fator tão importante como o nível sonoro.

  • Assim, a perturbação causada por trabalhos de construção civil, durante um período de dois dias, é menos significativa, que a causada durante um período de dois meses.
  • Do mesmo modo, é menos incomodativo, ouvir um ruído durante meia hora por dia, do que ouvir o mesmo ruído, durante um período de oito horas, de um determinado dia.

A atitude individual perante a fonte de ruído

É sabido que, a atitude de um indivíduo perante o ruído, depende da sua vivência psicológica, social e cultural.

  • Por exemplo, um motociclista não se sente incomodado pelo ruído do seu próprio veículo;
  • Da mesma forma, é também muito tolerante em relação ao ruído gerado por outros motociclistas;
  • Pelo contrário, um apreciador de música clássica, frequentemente, reage muito mal à música rock;
  • Da mesma forma, as pessoas mais idosas, têm tendência para não suportar os “gritos” das crianças;
  • Também é sabido que, os povos mediterrânicos toleram muito mais o barulho, do que os povos do norte da Europa; tem a ver com o seu estilo de vida.

atitude individual perante o ruído

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa – o Decreto – Lei 9/2007 – O Critério de incomodidade

O critério de incomodidade legal, baseia-se na diferença entre o nível sonoro com a fonte em causa (denominado Ruído Ambiente – RA) e o nível sonoro se a fonte em causa (denominado Ruído Residual – RR).

Assim, o valor desta diferença (RA-RR) é comparado com um valor limite máximo, tendo em conta o período ou períodos do dia em que ocorre o ruído.

Nota: existem 3 limites para essa diferença, um para o período diurno, outro para o entardecer e outro para o noturno.

Assim, o critério de incomodidade definido nesta lei é o seguinte:

nº 1 b)  do artigo 13º

 

LAeq ra – LAeq rr

(RA-RR)

Valores reportados a 1 mês

O D é um fator dependente da duração do ruído em estudo no período de referência (anexo I do D.L.)

Diurno

07H00 – 20H00

Entardecer

20H00 – 23H00

Noturno

23H00 –07H00

Diferença entre o valor de LAeq ra (ruído ambiente) medido durante a laboração da empresa e o valor de LAeq rr (ruído residual), medido no mesmo período mas com a empresa parada

£ 5 dB(A)

+

 D

£ 4 dB(A)

+

 D

£ 3 dB(A)

+

 D

Para além disto, existem dois fatores agravantes, para componentes tonais e para as  impulsivas no ruído, emitido pela instalação, cada um no valor de 3 dB(A).

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa – critério de incomodidade não contempla o ruído de baixa frequência

Tem-se assim que,o critério de incomodidade previsto na lei contempla os seguintes fatores:

  1. Nível sonoro (amplitude)
  2. Espectro de frequência – tonalidade
  3. Características temporais
  4. Altura do dia
  5. Tempo de exposição

Não contempla os restantes:

  1. Espectro de frequência – ruído de baixa frequência
  2. Atividade desenvolvida pelas pessoas
  3. Atitudes individuais em relação à fonte ou ao ruído

Este facto, é bastante grave porque se sabe que é comum, ocorrerem situações de incómodo geradas por ruído de baixa frequência, sendo também sabido que estas situações geram reações muito veementes.

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa – apresenta lacunas técnicas no que se refere à avaliação de incomodidade gerada por ruído de baixa frequência

Sabe-se que, a reação de incomodidade de dos seres humanos relativa a ruído de baixa frequência é distinta da reação de incomodidade a ruído a frequências mais elevadas. Tal é reconhecido em diversos países na Europa como sejam Espanha (Catalunha), Alemanha, Suécia, Polónia, Dinamarca, etc. [2,3]

Em Portugal, não existe regulamentação especifica, sobre a avaliação de incomodidade gerada por este tipo de ruído, fazendo com que a regulamentação portuguesa esteja, tecnicamente, obsoleta.

Ruído – efeitos ao nível do conforto e bem-estar

A tabela a seguir apresentada, retirada de um estudo da Comissão Europeia, [4] mostra os efeitos do ruído no conforto e bem-estar, em termos dos conhecimentos atuais.

Tabela – Efeitos do ruído na saúde e bem-estar com evidência suficiente

Efeito

Dimensão

Indicador Acústico

Limiar

Domínio temporal

Distúrbio de incomodidade

Psicossocial, qualidade de vida

Lden

42

Crónico

Perturbação do sono auto reportada

Qualidade de vida, saúde somática

Lnoite

42

Crónico

Aprendizagem, memória

Desempenho

Leq

50

Agudo, crónico

Hormonas do stress

Indicador de stress

Lmax

Leq

ND

Agudo, crónico

Sono

Acordar, mobilidade, qualidade do sono

Lmax, interiores

32

Agudo, crónico

Acordar reportado

Sono

SEL interiores

53

Agudo

Saúde reportada

Bem-estar, saúde clinica

Lden

50

Crónico

Hipertensão

Saúde, Hipertensão

Lden

50

Crónico

Doença cardíaca isquémica

Saúde clínica

Lden

60

Crónico

Outra questão relevante referida no mesmo estudo [3], consiste em que a reação de incomodidade, não é igual para diferentes tipos de fontes, como se pode ver na tabela a seguir apresentada.

Tabela – Comparação de valores de Lden para diferentes fontes com respeito a incomodidade – Percentagem de muito incomodados

Lden

Estrada

Ferrovia

Aviões

Indústria

Geradores eólicos

55 dB

6 %

4 %

27 %

5 %

26 %

50 dB

4 %

2 %

18 %

3 %

13 %

45 dB

1 %

0 %

12 %

1 %

6 %

 

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa – a Constituição da República Portuguesa

O Artigo 8º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que estabelece o “Direito ao respeito pela vida privada e familiar” e a Constituição Portuguesa têm vindo a ser interpretados pelos tribunais da seguinte forma [4]:

Vários têm sido ao arestos em que o Supremo Tribunal de Justiça, chamado a pronunciar-se, tem sucessivamente reafirmado integrarem o direito ao repouso, ao sono e á tranquilidade, requisitos inerentes à realização do direito à saúde e à qualidade de vida. Constituindo emanação dos direitos fundamentais de personalidade, nomeadamente dos direitos à integridade física e moral a um ambiente de vida sadios, constitucionalmente tutelados como direitos fundamentais no campo dos direitos, liberdades e garantias pessoais, sempre para concluir que a ilicitude de uma ação ruidosa que prejudique o repouso, a tranquilidade e o sono de terceiros está no facto de, injustificadamente, e para além dos limites de socialmente tolerável, lesar aqueles baluartes da integridade pessoal, sendo o dano real lesão desse direito em qualquer das suas componentes.”

Supremo Tribunal de Justiça – Processo 2209/08.0TBTVD.L1.S1, proferida em 30-05-2013

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa – a proteção do direito à saúde

Têm-se assim que, legalmente, a questão da incomodidade gerada pelo ruído está longe de se esgotar no Regulamento Geral sobre o Ruído e outra regulamentação similar associada.

Desta forma, caso um queixoso alegue que, em virtude do incómodo gerado pelo ruído, a sua saúde está em risco, prevalece outro tipo de princípios, nomeadamente a Constituição da República Portuguesa.

Portanto, quando se trata de Ruído de Baixa Frequência, em primeiro lugar o que se tem de fazer, é provar que este existe objetivamente, de acordo com um critério tecnicamente válido, como seja o da norma alemã DIN 45680:2013 – Medição e avaliação de emissões de ruído de baixa frequência.

Existindo incomodidade, podem ter lugar os efeitos indiretos sobre a saúde.

Quando estes ocorrem, os direitos das pessoas estão protegidos pela Constituição da República, conforme referidos no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, aqui referido.

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa – a resposta dos agentes económicos

Do que foi atrás referido infere-se:

  • O enquadramento legal, no nosso país e na Europa, garante o direito ao bem-estar e à saúde;
  • Existem parâmetros de ruído, relevantes para a avaliação da resposta humana, em termos de conforto e bem-estar, que não são avaliados, nos termos do disposto no Decreto – Lei 9/2007,
  • A avaliação do Ruído de Baixa Frequência, não é um requisito explicito da lei portuguesa, embora hoje em dia se saiba que a reação das pessoas a este tipo de ruído é veemente, é distinta dos outros;
  • Os critérios de avaliação de incomodidade e de exposição ao ruído, determinados pelo Decreto – Lei 9/2007, mesmo em caso de serem cumpridos, são incompletos; 
  • Um agente económico que cumpra estritamente o que está disposto no Decreto – Lei 9/2007, pode não estar a responder, cabalmente, ao enquadramento legal existente no nosso país;

Ruído de baixa frequência  a legislação portuguesa – conclusão

Os gestores das infraestruturas económicas têm de ter em conta:

  • Não só a avaliação da incomodidade do ruído de acordo com os critérios definidos no Regulamento Geral Sobre o Ruído;
  • Devem também ter em conta, o que hoje em dia se conhece sobre a reação de incomodidade das pessoas a ruído de baixa frequência;
  • Esta realidade deve estar bem presente, sob a pena de incorrerem o risco de sofrerem reveses com grande impacto económico.

A aplicação de normalização de outros países relativa a Ruído de Baixa Frequência, é um garante do direito à saúde e, portanto, a sua aplicação enquadra-se no estabelecido pelo Supremo Tribunal de Justiça e na Constituição da Republica Portuguesa.

Referências do artigo Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa:

Aqui pode ver uma apresentação sobre Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa:

Ruído de baixa frequência – a legislação portuguesa from Carlos Aroeira

 

A Ruido de Baixa Frequência Engenharia pode colaborar em:

1. Através de ensaios acústicos, identificar a existência de ruído de baixa frequência de acordo com a metodologia da norma Alemã DIN 45680:2013 – Medição e avaliação de imissões de ruído de baixa frequência;

2. Identificar as fontes de ruído de ruído de baixa frequência;

3. Definir as ações necessárias para eliminar o ruído de baixa frequência;

4. Seguir a implementação dessas medidas.

Caso pretenda alguma informação adicional, por favor contacte-nos.

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