Ruído de aviões
Ruído de aviões em Lisboa (e não só)
Não é muito conhecido mas, por causa do ruído de aviões em Lisboa, a ANA – Aeroportos de Portugal, já assumiu (1) que tem a responsabilidade de, às suas custas, efetuar obras em casa das pessoas expostas a níveis de ruído excessivos, originados no tráfego aéreo no aeroporto Humberto Delgado, com o objetivo de reduzir os níveis de ruído interior das habitações.
Também não é muito conhecido, mas a Lei do Ruído (2)tem artigos específicos que servem para proteger, os lisboetas, do ruído de aviões do aeroporto Humberto Delgado.
Neste artigo, expõe-se a situação atual, no que se refere ao ruído de aviões em Lisboa e refere-se o que as pessoas podem fazer para fazer valer o seu direito ao descanso.
A minha opinião sobre a atitude dos Lisboetas perante o ruído de aviões
Em minha opinião, há muitos anos que a característica principal que caracteriza a atitude dos Lisboetas face ao ruído dos aviões, é a habituação.
Era eu um adolescente, a morar em casa dos meus pais, num apartamento na zona da Estrela, e lembro-me que, na sala de jantar, quando durante uma refeição, passava um avião, as pessoas paravam de falar, as vitrines nos móveis tremiam, tudo tremia, com o brutal ruído dos aviões a jato a passarem por cima da nossa casa. E ninguém se lembrava de reclamar.
Era, literalmente, comer e calar!
Uma história que ficou famosa aconteceu com um conhecido meu que, na sequência de algumas reclamações de incomodidade relacionadas com o ruído do novo comboio na Ponte 25 de Abril foi avaliar o ruído. Constatou, na altura, que quando passava um avião o ruído deste era muito maior que o do comboio na ponte e tinha de parar as medidas. Perante esta situação, do nível de ruído gerado pela passagem dos aviões ser superior ao do gerado pela passagem dos comboios, perguntou aos reclamantes se o ruído dos aviões não os incomodava, tendo estes respondidos que não, que o ruído que os incomodava era o do comboio ponte!
Este é um exemplo da importância da reação subjetiva das pessoas aos níveis de ruído.
É também um facto histórico que os lisboetas reclamam pouco contra o nível de ruído gerado pelo tráfego aéreo do aeroporto de Lisboa.
(NOTA: Agradecia às pessoas que leem isto que me comentassem se a sua opinião sobre a atitude dos lisboetas, relativa ao ruído de aviões, coincide com a minha, ou não.)
Os limites de ruído em Lisboa (e nas outras cidades em Portugal)
De acordo com o disposto no Artigo 11, da Lei do Ruído, relativamente ao valor limite de exposição, está disposto o seguinte:
- As zonas mistas não devem ficar expostas a ruído ambiente exterior superior a 65 dB(A), expresso pelo indicador L(índice den), e superior a 55 dB(A), expresso pelo indicador L(índice n);
O índice Lden refere-se ao período diurno e o Ln ao noturno.
Os atuais níveis de ruído em Lisboa
O mapa de ruído publicado pela Camara Municipal de Lisboa, que a seguir pode ser visto, evidencia que este limite é excedido, para o período noturno (3), em grande parte da cidade (a vermelho e amarelo torrado), fundamentalmente devido ao tráfego rodoviário e aeroportuário.
Figura 1 – Mapa de ruído para o período noturno, em Lisboa
O mesmo acontece para o período diurno (4).
Neste mapa, consegue-se ver claramente a pista do aeroporto e o trajeto que os aviões tomam.
Mapa (desatualizado) de ruído gerado pelo tráfego aéreo
Relativamente ao ruído gerado pelo tráfego aéreo, está disponível um mapa de ruído elaborado pela ANA, em 2016 (5).
Figura 2 – Mapa de ruído do aeroporto de Lisboa, para o período noturno
Pode-se constatar que os limites de ruído, para o período noturno (parâmetro Ln), atrás referido, no valor de 55 dB(A), estão também excedidos.
O mesmo acontece para o período diurno.
À frente, vai-se ver que este mapa de ruído, efetuado em 2016, está muito desatualizado.
A Lei do Ruído e as infraestruturas de transporte (Artigo 19)
No Artigo 19, da Lei do Ruído, é referido que as infraestruturas de transporte têm de cumprir os limites referidos no Artigo 11 ou seja, de 55dB(A) durante a noite (Ln).
É referido também, no nº3, que para efeitos do disposto nos números anteriores, devem ser adotadas as medidas necessárias, de acordo com a seguinte ordem decrescente:
- Medidas de redução na fonte de ruído;
- Medidas de redução no meio de propagação de ruído.
As medidas excecionais a tomar, caso não se consiga reduzir o ruído na fonte e na propagação de acordo com a Lei do Ruído
É também referido que (nº4), excecionalmente, quando comprovadamente esgotadas as medidas referidas no número anterior e desde que não subsistam valores de ruído ambiente exterior que excedam em mais de 5 dB(A) os valores limite fixados na alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º, podem ser adotadas medidas nos recetores sensíveis (as habitações , por exemplo), que proporcionem conforto acústico acrescido no interior dos edifícios.
A responsabilidade da implementação de medidas de redução de ruído no recetor na Lei do Ruído.
No nº5, por fim, é referido que adoção e implementação das medidas de isolamento sonoro, nos recetores sensíveis, referidas no número anterior compete:
- à entidade responsável pela exploração das infra-estruturas referidas nos nº 1 e 2 do presente artigo;
- ou ao recetor sensível,
conforme quem mais recentemente tenha instalado ou dado início à respetiva atividade, instalação ou construção, ou seja, titular da autorização ou licença mais recente.
Ruído de aviões – o crescimento de tráfego no Aeroporto de Lisboa
De acordo com a ANA (6) o crescimento do tráfego no Aeroporto de Lisboa foi o que se pode ver a seguir.
Figura 3 – Crescimento do tráfego aéreo no aeroporto Humberto Delgado
É sabido que o tráfego aéreo do Aeroporto Humberto Delgado tem crescido muito e que, portanto, o mapa de ruído efetuado em 2016 está muito desatualizado.
Tem-se assim que o aeroporto como fonte dos atuais níveis de ruído, é uma entidade recente.
Ruído de aviões – a responsabilidade da implementação de medidas de redução de ruído no recetor
À primeira vista, seriam os recetores (os proprietários das habitações) a ter a responsabilidade de tomar as medidas de redução de ruído nas suas habitações, por estas terem as suas licenças de habitação, depois da licença de exploração do Aeroporto de Lisboa.
Todavia isto não é assim.
O aeroporto, como fonte dos presentes níveis de ruído é uma entidade recente e, portanto, posterior às licenças de habitação da maioria das residências em Lisboa.
Portanto, de acordo com a lei, a ANA é a entidade responsável para a implementação das medidas de redução de ruído, nos recetores, ou seja, nas habitações.
A opinião da ANA sobre quem é que deve suportar os encargos, das medidas de redução de ruído, no recetor
A ANA, no seu “Plano de Ações de Gestão e Redução de Ruído para o Aeroporto Humberto Delgado, Lisboa”, de janeiro de 2018, prevê numerosas medidas para minorar a exposição dos Lisboetas ao ruído de aviões. Entre elas destaca-se a seguinte (página 10):
Ou seja, a própria ANA, já assumiu, que tem a responsabilidade de, às suas custas, efetuar obras em casa das pessoas, cujas habitações estão expostas a níveis de ruído excessivos, para reduzir os níveis de ruído no seu interior.
Ruído de aviões – a atuação da AENA em Espanha
A situação em Espanha, é aqui relevante, porque segue a mesma Diretiva Europeia que Portugal está obrigado a seguir.
Em Espanha a entidade similar à ANA – Aeroportos de Portugal é a AENA.
A AENA, de acordo com a lei em Espanha, e no âmbito do seu plano de ação contra o ruído, tem em curso um plano de isolamentos acústico nas cercanias dos aeroportos da sua rede, com o objetivo de que, no interior dos recetores sensíveis (habitações, escolas, hospitais, etc.), afetadas pelo ruído dos aeroportos, se cumpram os objetivos de qualidade acústica aplicáveis, no âmbito da legislação vigente em Espanha (6).
A realização de esta atuações de isolamento acústico, compreendem uma série de fases entre as quais figuram:
- Realizar medições acústicas em todos os recetores sensíveis afetados pelo ruído de aeroportos, que o requeiram, com o fim de determinar o isolamento acústico existente;
- Determinar a necessidade de isolamento acústico complementar;
- Em caso afirmativo, determinar as medidas corretoras que garantam o objetivo de cumprimento dos objetivos de qualidade acústica
- Efetuar obras e implementar as medidas de melhoria de isolamento acústico, que normalmente passam pela melhoria da caixilharia
- Posteriormente, naqueles casos em que se tenha levado a cabo atuações de isolamento acústico, existe a necessidade de comprovar que as ações realizadas permitem o cumprimento dos objetivos de qualidade acústica, dentro dos recintos protegidos.
A atuação da AENA, na prática
Na prática, isto funciona da seguinte forma:
- A AENA elabora mapas de ruído dos seus aeroportos;
- Determina os recetores sensíveis afetados;
- Comunica-lhes a possibilidade de serem abrangidos pelo programa de ação contra o ruído;
- Comunica-lhes que, caso estejam interessados, o comuniquem à AENA para ao agendamento dos ensaios;
- É efetuado um ensaio de isolamento de fachadas, em cada recetor e um levantamento das tipologias da construção;
- Face à tipologia de construção existente e ao resultado do ensaio acústico é verificado o cumprimento, no interior dos recetores sensíveis, dos requisitos de ruído da lei Espanhola;
- Caso os requisitos não sejam cumpridos, a AENA assume os encargos de pagar uma melhoria do isolamento da fachada das construções, o que por norma, consiste numa melhoria das caixilharias das janelas e portas.
A título de exempl,o a AENA num concurso publico de 2016, previa um valor de encargos de 2.540.000€ para a realização destes ensaios.
Tive a oportunidade de participar na realização de centenas destes ensaios e constatei in loco que, na vizinhança de alguns aeroportos em Espanha, são numerosos os edifícios com as fachadas melhoradas, pagas pela AENA.
Por exemplo, no caso de habitações com janelas com caixilharia com características de isolamento acústico mais fracas, como sejam as de correr, só com um vidro, em termos práticos, de acordo com este procedimento, resulta que é praticamente obrigatório efetuar uma melhoria da caixilharia, para serem cumpridos os requisitos legais vigentes em Espanha.
Sem dúvida, o mesmo se passa em Portugal.
O que AENA faz e o que a ANA não faz
A ANA, apesar de no seu plano de ação constarem medidas semelhantes às que a AENA implementa, que eu saiba, não comunica a nenhum dos afetados pelo ruído gerado pelo tráfego aéreo nos seus aeroportos, a possibilidade de efetuar melhorias no isolamento acústico das suas habitações, a correr por sua conta, conforme está referido no seu plano de ação de redução de ruído.
Ruído de aviões – o que fazer? – a mobilização nas redes sociais
Em minha opinião, a mobilização contra o ruído em Lisboa, que à data em que escrevo este artigo (junho de 2019) tem lugar no Facebook, é um excelente início para obrigar a ANA a cumprir os seus deveres, mas por si só, não se me afigura ser suficiente.
Ruído de aviões – o que fazer a seguir
- Parece-me que a próxima ação consiste em, cada um dos afetados, escrever uma carta à ANA, a reclamar a implementação do plano de ação na sua habitação. Penso que enquanto isto não for feito não se podem esperar milagres.
- Os afetados são os que caem na influência do ruído do aeroporto de Lisboa, como se pode ver na Figura 2.
- Caso a resposta não seja rápida e positiva, afigurasse-me que se deverá envolver um advogado para defender os interesses legítimos dos afetados, pelo ruído do aeroporto de Lisboa.
Referências
- Plano de Ações de Gestão e Redução de Ruído para o Aeroporto Humberto Delgado, Lisboa”, Resumo não técnico, janeiro de 2018
- Decreto-Lei n.º 9/2007
- http://www.cm-lisboa.pt/fileadmin/VIVER/Ambiente/Ruido/LN.jpg
- http://www.cm-lisboa.pt/fileadmin/VIVER/Ambiente/Ruido/LDEN.jpg
- http://www.apambiente.pt/_zdata/DAR/Ruido/SituacaoNacional/Mapas_GITs_Aereo/PT_a_LPPT_Mair_RNT.pdf
- AENA, Expediente DPM 162/16, Pliego de Prescripciones Técnicas
A Ruido de Baixa Frequência Engenharia pode colaborar em:
1. Através de ensaios acústicos, identificar a existência de ruído de baixa frequência de acordo com a metodologia da norma Alemã DIN 45680:2013 – Medição e avaliação de imissões de ruído de baixa frequência;
2. Identificar as fontes de ruído de ruído de baixa frequência;
3. Definir as ações necessárias para eliminar o ruído de baixa frequência;
4. Seguir a implementação dessas medidas.
Caso pretenda alguma informação adicional, por favor contacte-nos.